17.2.10

infinity

Pousei o relógio na mesa. O cinto, as calças, as botas no chão. Agarrei na tua cabeça até sentires a densidade da madeira da cama e o teu sangue provar o nosso amor. Poucos instantes depois, tombado o candeeiro pouco sofisticado e esquecidas as boas maneiras, prometi que não te magoaria nunca. Fiz-te rezar comigo. Cuidei da tua testa. O quarto pareceu cada vez mais pequeno, o que acelerou o meu ataque de pânico.
Quando me virei para ti, refeito do medo, já estavas na internet a pedir ajuda. Que eu quase te matei, que estás sozinho, que mal me conheces. E nesse instante lembrei-me do teu perfil, da fotografia do teu rabo, das palavras que trocámos, da minha morada e do número de telefone. Tudo verdade. Não te consegui mentir.

2.2.10

speechless

Não queres falar mais. Queres guardar a voz dentro de ti, como o coração. E escrever, eventualmente. Assumes que desistes. Só desistes de usar as palavras com a garganta e ar e tempo. Não tens uma língua para falar. Não tens pátria. Não tens espaço nem palco. Falta-te o texto para dizer. Como te falta uma viagem de metro. Por isso vais calar-te. Uma decisão pouca sensata. Talvez possas cantar e cantar tudo o que puderes cantar. Nada mais. Ninguém te exige mais. Não queres falar mais nem dançar mais. Só pensar e talvez nem isso e talvez nem isso. Queres evitar o vómito. De tantas palavras que tens ouvido e tentado procurar para conseguires sobreviver.